No dia 25 de Abril de 1974 estava em Kinshasa e foi à noite, quando
participava num jantar de aniversário do Lyons Club no Hotel Intercontinental,
que tive conhecimento por intermédio da televisão francesa do que se estava a
passar em Portugal.
Comigo, na mesma mesa, estavam vários amigos e entre eles o
representante da Embaixada Portuguesa na capital e o Director do Colégio
Português de Kinshasa, que logo ao ver as primeiras imagens dos soldados na rua
exclamou num tom irónico-sarcástico: Mudaram
as moscas!…
Depois a conversa centrou-se nesse acontecimento e posso dizer que de
uma maneira geral para todos os presentes e residentes portugueses no Zaire foi
uma espécie de alívio dadas as tensas relações que reinavam entre os dois
Países motivadas pela guerra na vizinha Angola.
A base da FNLA de Holden Roberto em território zairense, de onde
partiam os ataques contra as tropas portuguesas, era também motivo de grande
apreensão quanto a possíveis retaliações do Governo zairense para com os
portugueses que ali trabalhavam.
No entanto em 1975, aquando da independência de Angola, a fuga dos
portugueses que ali residiam, ao passarem pelo Zaire, mostraram-nos aquilo que
julgávamos nunca pudesse acontecer. Como ainda me dói recordar esses homens
mulheres e crianças, que depois de uma vida inteira foram obrigados a deixar
tudo o que construíram, transcrevo um pequeno excerto de um texto da Internet:
“O facto do Governo Português não acautelar ou, pior ainda, não
autorizar a transferência dos bens dos portugueses na altura da descolonização
foi uma das maiores injustiças, praticadas por quem mandava e a desgraça de
tanta gente, que após longos anos de trabalho, caiu sem culpa nem pecado na
mais odiosa das misérias, na pobreza extrema, no desespero, muitos na loucura e
até na morte. Foi a situação mais injusta e catastrófica que imaginar se possa!
Dum momento para o outro perderem todos os seus haveres sem nada terem
contribuído para essa perda. Serem forçados a abandonar o fruto do trabalho
árduo no decorrer de longos anos, de canseiras, vigílias, economias feitas à
custa de grandes sacrifícios. Deixarem empresas, fazendas, prédios, terrenos,
carros, dinheiro, a própria casa com seu recheio, objectos pessoais, roupas,
enfim... tudo, (houve pessoas que, se quiseram salvar a vida, regressaram
apenas a roupa que traziam vestida.)
Verem-se despojados de quanto haviam adquirido, custa muito a aceitar
e, é impossível explicar por palavras a quem o não viveu.”
“Espoliado
Velho
e dobrado sobre o cajado,
Segue... a esmolar o pão da vida!...
-Parece uma virgula mal metida
Num parágrafo mal articulado.
Foi soldado e comerciante honrado
Na Pátria plural que foi concebida
D'honra e sangue da Gesta convencida
Da justeza do Espaço conquistado
Espoliado... Retornado e só...
- Torrão de lama a virar em pó!...
Perdeu o sol e o Direito do chão...
- É trapo da bandeira... e caravelas
Chegadas ao cais e arreadas as velas
Por ventos de Leste... e Alta traição!...”
Campos Almeida