sexta-feira, 25 de abril de 2014

ONDE ESTAVA NO 25 DE ABRIL DE 1974



No dia 25 de Abril de 1974 estava em Kinshasa e foi à noite, quando participava num jantar de aniversário do Lyons Club no Hotel Intercontinental, que tive conhecimento por intermédio da televisão francesa do que se estava a passar em Portugal.
Comigo, na mesma mesa, estavam vários amigos e entre eles o representante da Embaixada Portuguesa na capital e o Director do Colégio Português de Kinshasa, que logo ao ver as primeiras imagens dos soldados na rua exclamou num tom irónico-sarcástico: Mudaram as moscas!…

Depois a conversa centrou-se nesse acontecimento e posso dizer que de uma maneira geral para todos os presentes e residentes portugueses no Zaire foi uma espécie de alívio dadas as tensas relações que reinavam entre os dois Países motivadas pela guerra na vizinha Angola.

A base da FNLA de Holden Roberto em território zairense, de onde partiam os ataques contra as tropas portuguesas, era também motivo de grande apreensão quanto a possíveis retaliações do Governo zairense para com os portugueses que ali trabalhavam.

No entanto em 1975, aquando da independência de Angola, a fuga dos portugueses que ali residiam, ao passarem pelo Zaire, mostraram-nos aquilo que julgávamos nunca pudesse acontecer. Como ainda me dói recordar esses homens mulheres e crianças, que depois de uma vida inteira foram obrigados a deixar tudo o que construíram, transcrevo um pequeno excerto de um texto da Internet:

“O facto do Governo Português não acautelar ou, pior ainda, não autorizar a transferência dos bens dos portugueses na altura da descolonização foi uma das maiores injustiças, praticadas por quem mandava e a desgraça de tanta gente, que após longos anos de trabalho, caiu sem culpa nem pecado na mais odiosa das misérias, na pobreza extrema, no desespero, muitos na loucura e até na morte. Foi a situação mais injusta e catastrófica que imaginar se possa!

Dum momento para o outro perderem todos os seus haveres sem nada terem contribuído para essa perda. Serem forçados a abandonar o fruto do trabalho árduo no decorrer de longos anos, de canseiras, vigílias, economias feitas à custa de grandes sacrifícios. Deixarem empresas, fazendas, prédios, terrenos, carros, dinheiro, a própria casa com seu recheio, objectos pessoais, roupas, enfim... tudo, (houve pessoas que, se quiseram salvar a vida, regressaram apenas a roupa que traziam vestida.)

Verem-se despojados de quanto haviam adquirido, custa muito a aceitar e, é impossível explicar por palavras a quem o não viveu.”

“Espoliado

Velho e dobrado sobre o cajado, Segue... a esmolar o pão da vida!... -Parece uma virgula mal metida Num parágrafo mal articulado. Foi soldado e comerciante honrado Na Pátria plural que foi concebida D'honra e sangue da Gesta convencida Da justeza do Espaço conquistado Espoliado... Retornado e só... - Torrão de lama a virar em pó!... Perdeu o sol e o Direito do chão... - É trapo da bandeira... e caravelas Chegadas ao cais e arreadas as velas Por ventos de Leste... e Alta traição!...” Campos Almeida

 

 

 

MANHÃ DE 25 DE ABRIL DE 2014


NEVOEIRO

 

“Nem rei nem lei, nem paz nem guerra, define com perfil e ser este fulgor baço da terra que é Portugal a entristecer – brilho sem luz e sem arder, como o que o fogo-fátuo encerra.

Ninguém sabe que coisa quere. Ninguém conhece que alma tem, nem o que é mal nem o que é bem. (Que ância distante perto chora?) Tudo é incerto e derradeiro. Tudo é disperso, nada é inteiro. Ó Portugal, hoje és nevoeiro…

É a Hora!”

Fernando Pessoa

NEVOEIRO