sábado, 9 de outubro de 2010

RAIZES...




O senhor de barbas é o meu avô Ezequiel, o meu ídolo e o meu companheiro de longas viagens.
Morreu em 1938, com 80 anos, tinha eu 12. Fomos, várias vezes, a pé, daqui até Óvoa, no concelho de Santa Comba Dão, visitar seu filho e meu tio Manuel, que dava aulas naquela localidade. Quando mais tarde ele foi transferido para a sede do concelho, as viagens continuaram e lá íamos os dois, calcorreando montes e vales, muitas vezes aparecendo de surpresa.
Nunca esqueci essas passeatas e estou ainda a ver meu avô, a meio do caminho, sentado num muro, com a bengala entre as pernas, limpando o suor com o seu lenço “Tabaqueiro”.
Para quem não sabe, o lenço “Tabaqueiro” também chamado “Alcobaça”começou a ser fabricado no século XVIII e era usado por camponeses, sendo a cor preferida, a vermelha. A textura e a dimensão nada têm a ver com os lenços de agora, pois tinham várias decorações e o seu cunho não era português, mas, parece, indiano. No começo parece ter começado a ser usado por aqueles que cheiravam “rapé” e servia para limpar o pingo do nariz!... Camilo e Júlio Dantas, nas suas obras, várias vezes se referem a eles.
Há muito que caiu em desuso, mas há dias vi-os no pescoço de um conjunto de elementos de um grupo de concertinas.
Mas voltando ao avô Ezequiel, apesar de todos estes anos passados, conservo dele ternas recordações. Tratava-me sempre por “meu menino”e em conversas com minha avó Umbelina, quando se referia a mim, ele dizia sempre o nosso menino…
Era um exímio contador de anedotas que tinham sempre como pano de fundo o Brasil, onde esteve emigrado alguns anos e de onde regressou com alguns patacos para governar a vida, como dizia.
As suas longas barbas conferiam-lhe um certo “estatuto” e era muito respeitado e ouvido por todos que com ele privavam. Sempre de bom humor, sorriso nos lábios, a hospitalidade era o seu cartão de visita e ai daquele que recusasse o seu convite para beber uma pinga na sua adega… Zangava-se, e fazia com que, mesmo sem sede, as pessoas lhe fizessem a vontade.
Tinha orgulho em dizer que tinha antecedentes judeus e para reforçar esse sentimento apresentava como certificados, o nome, o nariz e até o nome da avó Umbelina, também ela, segundo ele, de descendência judia.
Nunca esqueci o dia 29 de Dezembro de 1938 e o momento em que a sua mão deixou de apertar a minha, e ele partiu…

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